domingo, março 30, 2014

Quase amor



Queria falar sobre o amor com a propriedade de quem nunca teve. Amor no sentido de romance, esquecendo a parte fraternal e amizades, claro. Carrego na mala alguns projetos de relacionamentos, uns quase namorados, meios carinhos e fins inteiros, sem nem ter havido começos. Mala pesada, que vira e mexe prejudica minha coluna, mas poderia ser pior. Sou viciada em atropelar as coisas e sair jogando vírgulas pra tudo que é canto, vivo com a impressão de que meus começos já são os meios e talvez nem seja impressão. Sou mal acostumada a ser sincera e isso nunca me permitiu jogar, trocar de papel conforme a trama mudasse a direção. E quem não joga em tabuleiro, tende a virar peão.

Meu primeiro quase amor foi a minha paixão louca e platônica, tradicional, não? Três anos e uma novela mexicana. Algumas declarações infantis, menino paciente, nunca tivemos nem amizade e acredito que nesse ponto da vida se iniciou meu costume em sofrer. Como se fosse uma zona de conforto anti-amor, enquanto eu esperava desesperadamente que o amor invadisse, porque na realidade todo o conforto sempre foi só fachada.
Estendi minha sina até poder transferir todo o peso de querer e não saber amar pra um novo corpo, meu segundo quase amor. Esse, na verdade, passou longe de qualquer sentimento, mas foi meu primeiro namorado. Só status, só porque era legal, terminei um mês depois e nesse ponto começou minha rota de fuga oficial: Me ama? Adeus, não sei lidar com isso, desculpa. 

Anos e anos vomitando liberdade até aparecer meu terceiro quase amor. Falava tudo que eu precisava ouvir, me fazia companhia e carinho, bem cômodo até ele querer um maldito tempo. Depois de dois meses, do nada, como quem pede o açúcar na mesa do café. Senti pela primeira vez o gosto amargo de um fim antes do final, abortei pela primeira vez um relacionamento, sem saber que isso ainda seria normal pra mim. Senti fundo tudo isso por estar amando a ideia de namorar, não ele, nunca ele. Mas dei todo o tempo do mundo, porque relógio eu nunca fui. 

Curti pouco tempo a sensação de sangue escorrendo sem parar, até o início do quarto quase amor. Dois anos, algumas horas de felicidade extrema, milhões de litros de lágrimas, muita imaturidade, eu virando boneca numa prateleira cheia de desculpas e egoísmo. Só que hoje em dia boneca anda, então fui embora, odeio lugar apertado. O fim mais difícil e adiado da minha vida, mas de parto normal. 

Me doeu pouco porque eu já estava no quinto, isso mesmo, no quinto e último quase amor. Eu completamente metódica, cheia de listas, horários, conceitos e preconceitos. Ele completamente do avesso, me virando de ponta cabeça e me deixando o que eu nunca fui na vida: leve. A pessoa mais louca e sensata que eu já conheci na vida. Quatro meses que me valeram uma vida, meu segundo aborto de amor. Minha rota de fuga usada contra mim, justo na vez que eu daria tudo pra ficar, mesmo não sabendo. Senti direto na pele, pela primeira vez sem armadura. Respeitei. 

Queria falar sobre dedo na ferida, vodka com gelo e saudade, travesseiro molhado. Queria dizer que tô acostumada demais a sofrer e, talvez por isso, reconheço e acolho as dores de todas as minhas tentativas de amor e me assusto com coisas que só fazem bem, sem nem arranhar. Não sei quase nada do amor. Nada além de romances literários, filmes de comédia romântica, desabafo de amigas e umas poucas tentativas extremamente mal sucedidas. Conheço e admiro de nome, mas queria compartilhar minha única certeza: amor mesmo não dói.

segunda-feira, março 17, 2014

Shiiu, não se mexe!

Não chega desse jeito não. Me ligando, me fazendo rir, fazendo de tudo pra me ver. Não chega assim não, fazendo questão de mim, fazendo acontecer. Não vem cheio de atitude, me mostrando, logo de cara, que eu nunca tinha conhecido um homem antes. Não me conta suas histórias, sua vida doida, suas aventuras pelo mundo, que o meu mundo é do portão pra dentro. Não me invade. Não diz todas essas coisas que você sabe fazer e faz tão bem, para de falar sem pausa e me deixar boba te ouvindo. Faz assim, não sorri também. Tem sorriso que acaba comigo e o seu é nocaute. Não corta as minhas paranoias, não acaba com as dúvidas se eu devo mandar sms, se eu devo ligar, porque você já faz tudo isso e quando não, me pede um sinal de vida. Não me surpreende, não me encanta. É pedir demais? Não sai da mesmisse de todos os outros, não faz melhor ou tão melhor. Não me desarma, não estraga meus clichês. Não fica fazendo tudo certo, sem eu nem pedir. Não me acostuma mal, ou melhor, não me acostuma. Olha, fica aí quietinho, que só em existir você já me bagunça toda. Você só me faz o favor de piorar, da maneira mais incrível possível, aí fica tudo revirado e depois ninguém fica pra arrumar, sobra pra mim, sempre. Sobra mais um fim. Não se mexe!

quinta-feira, março 13, 2014

Eu tempestade, meu adeus brisa



Até hoje, vou te contar, eu penso na mensagem que você nunca mandou, nas coisas que você nunca me disse. Ainda espero, em silêncio e relutante. Lembro da gente nas músicas que você nunca me dedicou. Sinto saudade de você, que nunca foi meu. Do nós, que sempre foi eu. Saudade da coisa mais linda que já me aconteceu, mas que na verdade, nem chegou a existir. A loucura mais sensata da minha vida, ou a sensatez mais louca, quem sabe? Amei muito e de verdade, não nego. Ele ou uma idealização, não posso distinguir ao certo, mas era amor e isso não é contestável. E hoje eu me pergunto, com a minha vida seguindo tão bem e a ausência despercebida num canto, se ainda amo. Nada mudou, além de mim, e tudo parece tão diferente, tão distante, tão fora de mim- e dessa vez, acredite quem quiser, por repulsa minha. Mas creio que seja um quase ou pós amor, muito carinho, alguma coisa menor e bonita assim. Porque, seja lá o que ainda resta, é quieto e não grita mais nos meus silêncios, nos meus ouvidos. Não me tira o sono, não me tira o juízo, a paz. Não é espaçoso, muito pelo contrário, compacto. Dizem que o amor é assim, calmo, sereno, brisa. Mas eu não acredito nesse amor que não invade, não vira do avesso, não desarruma. Não consigo imaginar o amor batendo na porta, comportado no sofá. Esperando você oferecer um copo d’água, café, bolo. Com licença, por favor, muito obrigada. Não o meu amor, não comigo. Meu amor pula a janela, põe os pés no sofá e pede mais uma almofada. Reclama que tá com fome e abre a geladeira pra ver o que tem de bom. Rouba o controle, muda o canal, faz bagunça. Meu amor é tempestade, terremoto, erupção. Brisa, comigo, só o fim, só sem mim. Sereno, deixo claro, só meu adeus.

terça-feira, março 11, 2014

Não era amor, era Roma



Ele escolheu não sentir. Simples assim, frio assim, como quem escolhe uma roupa de manhã. E ele sempre achou isso o máximo, certo de que era muito forte e que ser completamente racional era motivo pra medalhas. De longe eu pude ver ele atrapalhado entre os escudos, todo aquele teatro podia convencer muita gente, mas eu sempre soube que sentir não era uma opção e que tinha muito por baixo de toda aquela capa mal remendada. E tinha mesmo, uma pessoa linda, eu juro. Bem, bem escondida, trancada debaixo da cama, como aqueles monstros da infância. Acho triste, covarde e solitário. Fraqueza demais deixar uma pessoa te matar por dentro. Ele se via o herói de Tróia, eu via um guerreiro medroso abaixando a espada pra primeira bandida. E, por coincidência, teste ou algum tipo de missão, sou casa pra esse tipo de gente que se embaralha toda com essa coisa de sentir e acha mais prático ou cômodo se bloquear. E eu, toda atrapalhada por natureza, tenho que ficar ensinando, arrumando, resgatando, me bagunçando. Enfim, sou jogada no campo de batalha, sem aviso, sem nem que eu perceba. Só que, instintivamente, não sou do tipo que recua, meu ataque não é agressivo e isso, por incrível que pareça, assusta bem mais que uma estratégia friamente calculada ou uma fuga de mestre. Quem vive se escondendo atrás de uma máscara não suporta a ideia de alguém descrevendo e percebendo cada gesto por trás, tudo que é tão rigorosamente protegido e escondido. Tem gente que não quer ser resgatada e eu sou livre demais pra viver com alguém prisioneiro. Tecnicamente, não ganhei a batalha. Sinceramente, não fui eu que perdi.
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